terça-feira, 10 de junho de 2008

Para sempre



( Amanheci com a lua moribunda a olhar-me descaradamente o percurso das lágrimas. Dos olhos até ao peito. Onde evaporaram.)

Antes nunca me escrevias cartas tão longas nem tão sentidas. Nunca me escreveste tantas cartas, achei que era um daqueles teus hábitos do passado que tinhas deixado lá atrás. Achei sempre que me dizias só o suficiente para que eu percebesse que te interessavas e preocupavas comigo mas escolhias sempre as palavras meticulosamente de forma que não te comprometesses muito. De forma que, de vez em quando e mesmo sem querer, fizesses promessas que sabias que não ias cumprir. Antes, as tuas escassas cartas não me faziam chorar. Cansavam-me. Em cada palavra havia ainda um resquício do teu suor austero, a presença de outra e outra e outra palavra no lugar daquela. Como se não soubesses bem o que dizer. Ou como se tivesses vergonha de dizer que gostavas de mim. Hoje falaste-me do coração e fizeste-me chorar. Nunca li nada tão simples em toda a minha vida. E, finalmente, começo a acreditar que a simplicidade pode ser mesmo uma virtude. Não usaste metáforas, imagens elaboradas, recursos estilísticos ou palavras eloquentíssimas- daquelas que nos fazem perder vinte minutos no dicionário e que provam como somos inteligentes, cultos e insensíveis. Disseste "amo-te" com histórias triviais e mil vezes repetidas, a medo e com erros ortográficos e criaste o poema mais bonito do universo. Falaste de mim num tempo que não recordo e falaste de um amor que eu não supunha que tivesse tanta poesia. Ou tanta força. Sempre achei que me amavas em proporção com o silêncio e a falta de palavras entre nós. Nunca me ocorreu que dentro de ti também pudessem viver mundos cheios de palavras bonitas que me acariciassem e me fizessem sentir importante. Ou sonhos repletos de fantasia e sorrisos. Esse foi o meu erro: olhar-te para as mãos grossas, rudes e calejadas da vida e nunca tentar imaginar que história tinham para contar, que caminhos pecorreram até chegar aqui. Hoje descobri que as tuas mãos estão calejadas de tanto batalhares. Por mim. Por nós. Mas que também sonham e sentem.
Há coisas que nao entendo bem. Como é que a força de um amor assim não permite que vivamos até aos 500 anos? A coisa mais verdadeira que conheço é este nosso amor que não pede nada em troca, que não pressiona, que indica o caminho sem nunca obrigar a segui-lo, um amor que vive no silêncio ou na confusão, na dor ou na felicidade, em harmonia ou em disputa, não importa, existe e assume todas as formas do mundo. Um amor-motor assim devia fazer o coração bater para sempre.
Quero tanto acreditar que estou a falar de um sentimento que nasce, cresce e vive sob a insígnia do ETERNO... Quero mesmo acreditar que tudo vale a pena.


Da próxima vez que me escreveres diz-me que a nossa história não acaba aqui.
Neste mundo que nos agarra com os dentes todos os dias.

3 comentários:

Eduardo disse...

Afinal sempre conseguiste justificar o texto...lol
Mas que belas cartas sao essas!deixa-me dizer que este texto tocou-me especialmente...
Muito bom, muito bom!

Manteigas disse...

Por mero acaso vim dar a este blog, mas fiquei entorpecido com tamanha sabedoria e escrita cuidadosa da tua parte.Fiquei fã dos teus textos, agora virei todos os dias a este blog, á procura de linhas que me completem, pois os teus textos trazem-me conforto!continua.
um grande ósculo.

Anónimo disse...

Aaaaaaah és tão boa no que fazes, porra. xD

Mais uma vez, palavras deliciosas, sentimento ao rubro, o toque perfeito. =)